Menos de duas semanas depois de enfrentar julgamento no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o ex-presidente Lula será alvo, novamente, de delatores, desta vez no processo em que é acusado de ser dono do Sítio Santa Bárbara, em Atibaia. Na primeira semana de fevereiro, sete testemunhas de acusação - todos colaboradores - vão depor ao juiz federal Sérgio Moro no caso que envolve supostas propinas da OAS e da Odebrecht.
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O imóvel em Atibaia, em nome de Fernando Bittar, filho de Jacó Bittar, ex-prefeito de Campinas pelo PT, é pivô de mais uma ação penal em que Lula é réu por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O Ministério Público Federal sustenta que as reformas bancadas pela Odebrecht e a OAS dissimularam pagamentos de R$ 1 milhão ao ex-presidente.
No dia 5 de fevereiro, os marqueteiros João Santana e Mônica Moura, que confessaram ter recebido pagamentos da Odebrecht no exterior para realizar as campanhas petistas, vão depor.
No mesmo dia, está marcada a audiência do ex-gerente da Área Internacional da Petrobrás, Eduardo Musa, que admitiu direcionar licitação na estatal para o grupo Schahin para sanar dívida de R$ 60 milhões com o partido no caso que envolveu empréstimo fraudulento ao pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente.
Dois dias depois, na quarta-feira, 7 de fevereiro, Milton e Salim Schahin vão prestar depoimentos. Segundo a Lava Jato, do grupo teria saído parte dos recursos para bancar reformas no sítio. O procuradores sustentam que, por meio de 23 repasses, R$ 150 mil oriundos de contratos para a operação da sonda Vitória 10.000 entre Schahin e Petrobrás foram destinados ao acabamento do Santa Bárbara, 'adequando-o às necessidades da família do ex-presidente'. Os valores teriam sido operacionalizados por Bumlai.
Para o mesmo dia, ainda estão marcadas audiências com o engenheiro Marcos de Almeida Horta Barbosa, que é aderente ao acordo de leniência da Odebrecht com o Ministério Público Federal e o ex-presidente da Braskem Carlos Alberto Fadigas, um dos 77 delatores da empreiteira.
O ex-deputado Pedro Corrêa, condenado no Mensalão e na Lava Jato também é um dos delatores que falarão de Lula em fevereiro. No dia 22, está marcada a audiência do ex-parlamentar do Partido Progressista. Em seu acordo, homologado em 2017, Corrêa relatou interferência do ex-presidente Lula junto ao ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa por pagamentos ao partido e que o petista tinha conhecimento de esquemas de corrupção na estatal.
Na denúncia de 168 páginas envolvendo o sítio de Atibaia, 39 testemunhas foram arroladas pela força-tarefa; 20 são delatores. Com Pedro Corrêa, que teve o termo homologado meses depois da denúncia, passam a ser 21 os delatores que falarão nesta ação penal.
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Pela primeira vez, Suíça condena banqueiro por papel na Lava Jato
A Justiça suíça condena, pela primeira vez, um banqueiro por conta de seu papel em esquemas de corrupção revelados pela Operação Lava Jato. Um dos diretores do banco Heritage violou as leis do país europeu ao não notificar às autoridades sobre as movimentações suspeitas do ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró. O brasileiro conseguiu, assim, praticamente esvaziar sua conta enquanto ela não foi denunciada e bloqueada.
Em 2017, o jornal O Estado de S. Paulo revelou com exclusividade como os bancos suíços passaram a ser investigados por seu papel na Lava Jato, depois que o Ministério Público em Berna descobriu mais de mil contas envolvendo o escândalo no Brasil. Pelo artigo 37 da lei suíça sobre o combate à lavagem de dinheiro, bancos são obrigados a notificar a agência de controle financeiro diante de qualquer indício de movimentações fora dos padrões ou que impliquem volumes suspeitos.
A constatação do Tribunal foi de que o diretor-adjunto do banco, Thierry Zumstein, violou essa determinação, apesar de contar com informações suficientes que apontariam para suspeitas em relação ao cliente. Ele já havia sido condenado em primeira instância a pagar uma multa de 30 mil francos suíços. Mas recorreu.
Apesar de confirmar a condenação, o tribunal reduziu a pena para apenas 15 mil francos e os custos do processo, uma fração do valor que passou pelas contas de Cerveró. Ainda assim, a condenação é considerada como simbólica, já que representa um reconhecimento das falhas dos bancos no esquema no Brasil.
Entre os banqueiros, a condenação também foi recebida como um recado de que a Justiça suíça, de uma forma inédita, irá aprofundar os inquéritos para tentar determinar a responsabilidade dos intermediários financeiros no caso da Lava Jato. No total, US$ 1,1 bilhão foram encontrados nos bancos suíços relativos ao escândalo no Brasil.
Pasadena - O caso julgado se refere às contas da sociedade Forbal Investiment, com sede em Belize e contas na Suíça desde 2008. Cerveró foi preso no Brasil em janeiro de 2015 e condenado à prisão.
Entre dezembro de 2014 e janeiro de 2015, com Cerveró já sob investigação, o banco não teria tomado a iniciativa de informar as autoridades sobre a existência das contas. Enquanto isso, ela foi praticamente esvaziada, passando de mais de US$ 200 mil para apenas US$ 6,1 mil. Foi apenas no dia 27 de janeiro de 2015 que o banco decidiu ir às autoridades e revelar a existência das contas. A decisão foi tomada depois que jornais brasileiros já haviam noticiado a prisão de seu cliente.
De acordo com a investigação, o banco sabia das suspeitas que pesavam sobre Cerveró desde o início de 2014, quando primeiro foi revelado o caso da compra da refinaria de Pasadena, pela Petrobras. Reuniões internas no banco foram realizadas para tentar decifrar se a referência ao cliente era suficiente para denunciar sua conta às autoridades suíças, uma obrigação por lei.
Em março de 2014, Cerveró foi afastado da Petrobras pelo escândalo de Pasadena. Mas, em maio daquele ano, o banco decidiu “não comunicar” o caso de seu cliente às autoridades. O banco chegou à constatação de Cerveró era apenas uma “testemunha” e que não haveria nada contra ele. Foi decidido que, se os recursos de o ex-diretor da Petrobras estivessem bloqueados no Brasil, o banco também o faria. Mas, de contrário, nenhuma iniciativa seria tomada.
Num relatório interno, o banco chega a mencionar a ex-presidente Dilma Rousseff, apontando que ela se defendeu alegando que “certas cláusulas do contrato (de Pasadena) não foram mencionados no informe prestado pelos serviços de Cerveró”.
O mesmo informe interno do Heritage explicou que “as críticas contra a compra da refinaria ocorriam no contexto das eleições presidenciais no Brasil”. “Algumas matérias mencionavam mesmo que a compra da refinaria poderia se revelar como um dos melhores negócios concluídos pela Petrobras em 30 anos”, apontou a sentença do tribunal, citando o informe do banco.
O Heritage, assim, “conclui seu memorando dizendo que, naquele estágio, não haveria nenhuma razão para duvidar da origem legal dos bens depositados” por Cerveró. Nenhum anúncio às autoridades fora feito e o banco decidiu continuar a relação com seu cliente.
“Imprensa exagerada” - Em outubro de 2014, o banco voltou a olhar ao caso de Cerveró, diante de um relatório do TCU que o citara e teria indicado o congelamento de sua conta. Mas um dos funcionários de controle do Heritage alegou em outro informe que “a imprensa não era verdadeiramente confiável e que tinha tendência ao exagero, em especial no Brasil”. A informação do congelamento da conta ainda foi negada pelo advogado do brasileiro, versão que foi privilegiada pela direção do banco.
No dia 27 daquele mês, o banco pediu que um dos funcionários do Heritage voltasse a ler as 324 páginas do documento do TCU e determinasse se Cerveró estava ou não implicado no caso. Uma semana depois, o funcionário “alegou que o português não era sua língua nativa” e relativizou o conteúdo do informe. Segundo o tribunal, porém, “o funcionário falava fluentemente essa língua” e deu crédito apenas à versão dos advogados de Cerveró.
No dia 1º de dezembro, comunicados internos do banco voltam a chegar à constatação de que não havia necessidade de informar às autoridades.
Durante o período em que o banco se recusou a informar às autoridades, o tribunal revela como Cerveró esvaziou a conta. Ela passou de um saldo original de US$ 200 mil, para US$ 97 mil no início de dezembro de 2014 e para apenas US$ 6,1 mil quando foi finalmente denunciada, em janeiro de 2015.
Na avaliação do Tribunal, alertar às autoridades era uma obrigação de Zumstein, que dirigia o departamento de compliance do Heritage. “Ele foi negligente”, determinou o tribunal que, apesar da condenação, qualificou sua culpabilidade “de leve a média”.
A lei permitiria o tribunal cobrar uma multa de até 150 mil francos suíços. Mas, por conta do histórico do banqueiro e do fato de ele ter colaborado plenamente nas investigações, a Justiça aplicou uma pena praticamente simbólica.
Ainda assim, para a juíza Nathalie Zufferey Franciolli, a mera existência de uma dúvida já deveria ser suficiente para que o banco comunicasse o caso às autoridades. Cerveró ainda era classificado dentro do sistema financeiro suíço como PEP – Pessoa exposta politicamente. Na prática, isso exigiria do banco um maior acompanhamento sobre suas movimentações.
O diretor de compliance do banco não foi o único punido. Em abril de 2016, a agência reguladora do sistema financeiro suíço, a FINMA, contatou que o Heritage violou “gravemente” as leis ao não conseguir controlar a origem do dinheiro brasileiro depositado em suas contas.
Contatado pelo jornal O Estado de S. Paulo, o banco Heritage não deu respostas sobre os questionamentos colocados pela reportagem e nem sobre a situação de seu banqueiro condenado. Mas indicou que vai recorrer da decisão.
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